Desde o início da pandemia, mudamos drasticamente nossa rotina. Adotamos o distanciamento social, hábitos de segurança sanitária e, claro, uma nova forma de trabalhar, que envolveu transferir a rotina do ambiente de trabalho para dentro das nossas casas.
Se, por um lado, neste momento de pandemia o trabalho não presencial pode parecer um benefício, por outro, há de se atentar às condições reais em que esse trabalho vem sendo realizado, bem como as possíveis consequências disso para a saúde dos servidores e seus familiares.
O assédio moral é tema frequente de debate pelo Sinjusc. Em tempos de home office, ele assume características diferentes, muitas vezes de formas ocultas e também gerando um “pacto de silêncio” devido ao medo de se expor, bem como de prestar solidariedade com colegas assediados. O medo é o afeto que engendra e possibilita a disseminação do assédio moral.
Caracterizam o assédio moral toda e qualquer conduta por comportamentos, palavras, atos ou, gestos, de forma repetida, que possam configurar perseguição, discriminação ou abuso de qualquer natureza, e que tragam danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física e psíquica de uma pessoa.
Trabalhar em casa pode levar a uma ideia de maior produtividade, o que pode aumentar as exigências de chefias com relação aos resultados esperados. Além disso, comentários maliciosos ou avaliações ruins sobre a indisponibilidade do profissional, também são condutas que não devem ser naturalizadas.
As situações mais comuns, relacionadas ao assédio moral no home office e teletrabalho, tem relação com cobranças descabidas de desempenho e disponibilidade do servidor que estão para além da capacidade de uma jornada de trabalho, causando sobrecarga e aumento do ritmo de trabalho.
Neste quesito, as mulheres, maioria no judiciário catarinense, são as mais prejudicadas. Isso porque, de maneira geral, são as protagonistas das tarefas domésticas e parentais. Por isso, passa a ser bastante complicado responder demandas fora do horário de expediente.
Acúmulo de funções, aumento na carga horária, cumprimento de metas inatingíveis ou muito difíceis, exigência de tarefas fora do escopo do cargo ou fora da jornada de trabalho, são situações que também caracterizam o assédio moral.
Esses tipos de cobranças podem resultar em esgotamento físico e mental do servidor, gerando uma série de prejuízos psicológicos.
Menos frequentes, mas não menos graves, também configuram assédio:
❯ Isolamento virtual: quando o servidor tem suas ideias e sugestões ignoradas por todos ao longo de reuniões e comunicações.
❯ Superexposição: o contrário também acontece, quando existe a super exposição do profissional perante os demais colegas, em forma de críticas ou piadas a seu respeito.
❯ Assédio sexual: quando acontece o compartilhamento de textos e fotos íntimas indesejáveis, ou qualquer forma de comunicação com conotação sexual.
Pensando no bem-estar do trabalhador, o Sinjusc dispõe de meios para promover a comunicação segura e o acolhimento aos servidores em questões relacionandas à saúde no ambiente de trabalho, às dificuldades do trabalho remoto e ao assédio moral. Nosso suporte é baseado na ética e no sigilo, com o intuito de conduzir à resolução de conflitos no ambiente de trabalho e na promoção da melhoria no bem estar geral dos servidores.
Nossa Secretaria de Assuntos Jurídicos presta orientações legais aos servidores e atua em processos, através de um advogado contratado.
Quando a sala de estar, o quarto ou até a cozinha se tornam o escritório, desligar-se do trabalho pode ser um desafio. Deixar de responder mensagens e emails fora do horário de expediente, ou mesmo de atender ligações da chefia no período de descanso, está abarcado no chamado direito ao desligamento do trabalho.
A ausência do desligamento do trabalho compromete a integridade física e mental do servidor, podendo inviabilizar projetos pessoais bem como limitar o convívio social. Então após definir um cronograma determinado de trabalho para aumentar o desempenho e desenvolver um horário de trabalho saudável, no final do dia, desligue o laptop e defina seu status no aplicativo de trabalho como “ausente”. Importante que os gestores abram e fechem os grupos de trabalho no whatsapp respeitando os horários contratuais dos servidores.
O avanço tecnológico e o aprimoramento das ferramentas de comunicação devem auxiliar na melhoria das relações de trabalho e trazer maior efetividade e não maior desgaste psicológico decorrente do trabalho.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) emitiu a Nota Técnica 17/2020, com recomendações para o home office. Entre as diretrizes presentes, a referida Nota destaca o respeito à jornada dos trabalhadores, a observância dos aspectos ergonômicos e a oferta de equipamentos de trabalho adequados.
O fornecimento de equipamentos condizentes com a realidade do home office passou a ser fundamental para viabilizá-lo a longo prazo, de modo que, não havendo essa possibilidade, todo o sistema fica comprometido e quem mais sofre é o trabalhador.
A realidade que temos visto é a de servidores utilizando os equipamentos eletrônicos pessoais e o mobiliário doméstico para a realização de suas tarefas. A consequência disso é o esgotamento físico do trabalhador, pela falta de ergonomia na realização das tarefas, e o aumento dos gastos pessoais, já que o servidor passa a arcar com os custos de energia, internet e manutenção dos equipamentos.
56,1% dos servidores públicos afirmam que houve um aumento de gasto pessoal para trabalhar em casa.
Fonte: “O trabalho remoto/home office no contexto da pandemia COVID-19” – UFPR
O trabalho remoto, sobretudo no poder público, ainda é muito recente para que sejam feitas afirmações definitivas e conclusivas sobre o seu futuro. Porém, a visão “romântica” do home office não é novidade e se intensificou desde que se iniciou e se expandiu a pandemia do coronavírus.
Panoramas sobre as vantagens do teletrabalho, quase sempre citando suposto ganho de produtividade e economia, vêm sendo amplamente divulgados pelo Governo Federal.
Essa defesa segue a estratégia de um governo orientado por políticas de ajuste fiscal e corte de gastos públicos, para seguir atacando o funcionalismo público, visto basicamente como um “problema fiscal”.
É importante lembrar que esse mesmo governo é autor da reforma administrativa proposta pela PEC 32 de 2020, que precariza o emprego público e praticamente acaba com a estabilidade dos futuros servidores, em nome de uma pretendida redução de gastos.
Enquanto encaramos o home office como benefício, não nos damos conta que estamos trabalhando mais, por mais horas e com menos recursos. Os prejuízos disso já estão sendo sentidos na nossa saúde física e mental, no nosso bolso e na garantia dos nossos direitos.
O trabalho não presencial e seus efeitos, sobretudo no poder público, ainda são muito recentes para que sejam feitas afirmações definitivas e conclusivas sobre o seu futuro. Existe um novo rumo e um novo ritmo no mundo do trabalho que está por ser definido. E, muitas vezes, o rumo e o ritmo podem definir ou implicar quão ganhadores ou quão perdedores somos frente a este cenário.