A psicóloga Ana Luiza de Souza Castro é contra as reformas do atual governo. Coordenadora da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP), trabalha no Poder Judiciário do Rio Grande do Sul desde 1987. Mora em Porto Alegre. Para ela, a retirada de Dilma Roussef da presidência da República foi um golpe em favor do mercado financeiro e dos grandes empresários. Aponta que o governo Temer é inimigo de direitos, de pessoas e de trabalhadores. E constata que os resultados do golpe contra um governo eleito democraticamente se reflete nos consultórios, no sistema público de saúde e no judiciário. Abaixo, Ana Luiz respondeu a uma entrevista por e-mail para o site do SINJUSC. Acompanhe.
Temer pratica estelionato eleitoral?
Bem, antes de tudo, o golpe midiático-parlamentar-judiciário foi dado com um claro objetivo: redistribuição de renda. Transferir renda dos pobres, dos trabalhadores, para o mercado financeiro e para o empresariado. Basicamente, o fim buscado foi a redução líquida da remuneração dos trabalhadores, induzindo uma recessão violenta, desmanchando a política industrial até então em curso, isentando impostos de importação de equipamento, mudando o regime de exploração do petróleo, causando enorme desemprego, aumentando os juros, cortando despesas sociais. A reforma Trabalhista segue no mesmo objetivo: deprimir o preço do trabalho, retirando direitos, facilitando as despedidas, enfraquecendo os sindicatos e dificultando o acesso à Justiça. O próximo e o mais danoso dos passos à vista é a reforma da Previdência. Aqui, a intenção é pagar benefícios por menos tempo e, além disso, com um valor mais baixo; ou dito de um modo mais cru: as pessoas devem viver menos tempo recebendo uma aposentadoria menor. O programa “Ponte para o Futuro”, apresentado meses antes do impeachment já anunciava isso em grandes linhas: na essência, foi o programa derrotado nas eleições de 2014. Contudo, houve quem acreditasse que o assunto em debate era a corrupção.
O Conselho Federal de Psicologia tem posição e lado diante das propostas do governo Michel. Por quê?
O CFP tem um compromisso histórico na defesa dos direitos humanos, dos direitos fundamentais. Inicialmente, os básicos, direito à vida, à liberdade, à igualdade perante a lei, abarcando ainda o de votar e de ser votado. Mas, também, os direitos sociais, de segunda geração, que compreendem, basicamente, o direito ao trabalho e a um salário mínimo; à limitação da jornada laboral; à proteção do adolescente e da gestante no serviço; o direito de fazer greve e de formar sindicatos, o direito à saúde e à educação, ao amparo na velhice, na doença e no desemprego. Sem esquecer os outros, como o direito à paz, à autodeterminação, ao desenvolvimento e ao meio ambiente. Também nos preocupamos em defender a intimidade, a privacidade e o patrimônio genético das pessoas contra o uso inapropriado da informática e da bioengenharia. O Governo Temer é inimigo de todos e de cada um desses direitos. Portanto, temos lado: a defesa dos diretos humanos, dos direitos fundamentais. Mas talvez , a face mais cruel seja o aumento de mortes de pessoas LGBTS. O Brasil tem batido os infelizes índices após o golpe. Não há dúvida que a violação de Direitos Humanos tem crescido assustadoramente.
Podemos dizer que povo está acuado, apático, catatônico, diante de tantas coisas que estão acontecendo no País e no governo?
A população esteve confusa. A corrupção e a violência agridem a todos, sobretudo os mais pobres. Combatê-las é uma necessidade. Somos bombardeados há anos pelo discurso do medo, da impunidade. A política do medo é global: terrorismo, imigrantes ilegais, traficantes, desemprego. Tudo isso assola o planeta, dos Estados Unidos à Europa. O mercado financeiro capturou os estados nacionais e suas instituições. Isso esvaziou a democracia e abriu caminho para Brexit, Trump, Le Pen e toda a sorte de saídas simplistas. As ondas desse movimento atingem a América Latina, depois de varrer diversos continentes. A concentração e a globalização da mídia, associada à manipulação das ditas redes sociais, induz um pensamento único. Os documentários da Fox, em seus canais Discovery, mesmo quando tratam de temas inocentes como os animais na África, focam na competição, no mérito dos mais aptos, na guerra pela sobrevivência: pura ideologia. A tarefa é responder a esse desafio, aqui e no mundo. O desemprego, a fome, os cortes na saúde e na assistência social impostos pelo governo golpista trazem pobreza, depressão, muito sofrimento. Situações observadas em consultórios, serviços públicos de saúde e sistema de justiça. Sem perder a esperança, é necessário agora denunciar e resistir.