PGR rechaça ampliação de comissionados sem concurso no MPSC

Parte 1

A procuradora-geral da República considera inconstitucional 12 leis aprovadas pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) entre 2002 e 2017 que permitem a contratação de comissionados sem concurso para gabinetes de promotores e procuradores do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).

A manifestação de Raquel Dodge foi solicitada pelo relator, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandovsky no início do mês, e agora integra a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5777, movida pela Associação Nacional dos Servidores do Ministério Público (Ansemp).

Num paralelo, o SINJUSC luta para que o Tribunal de Justiça catarinense preencha as assessorias de juízes somente com concursados. Mas parece que a orientação é outra. O Sindicato vê risco de pegar a moda dos comissionados indicados no Tribunal. Para defender o concurso e o fim dos indicados, só tem um jeito: luta! Veja aqui e aqui.

Para compreender um pouco melhor a luta contra a precarização do trabalho e a defesa do concurso público no MPSC, o SINJUSC entrevistou o presidente do Sindicato dos Servidores do Ministério Público em Santa Catarina (SIMPE-SC) e diretor da Federação Nacional dos Servidores do Ministério Público (Fenamp), Gilmar Rodrigues.

SINJUSC – Qual a posição do Sindicato e da Federação com relação ao parecer da procuradora-geral da República?

Gilmar Rodrigues – O Sindicato e a Federação têm posição bem clara sobre o que é serviço público e que nele só se pode ingressar por concurso público, forma mais democrática e que proporciona condições iguais a todos para o acesso ao cargo público. Enfatizamos que os argumentos utilizados para contratar comissionados são equivocados. O Ministério Público e o Poder Judiciário alegam a necessidade de pessoas de confiança em algumas funções. Mas veja bem: os pareceres são técnicos, e a confiança quem dá é a sociedade, através de concurso. Um trabalhador público não pode ser da confiança de alguém porque um processo não é de determinado membro do Ministério Público ou de um juiz. É da comarca, da promotoria. Sob essa visão de precarização do trabalho público, quando ocorrem movimentações nas carreiras, quem perde é a sociedade, porque promotores e juízes levam juntos seus comissionados, já que são apenas de sua confiança. Com isto, o processo pára. Até que um novo promotor e seus assessores sem concurso o retomem, leva algum tempo. Se todos fossem concursados, o processo reiniciaria com a designação do novo promotor, e não somente depois que ele e seus comissionados tomassem pé da situação.

SINJUSC – O Ministério Público de Santa Catarina é um dos poucos, no Brasil, que não tem cargo efetivo para graduados em Direito. É proposital?

Gilmar Rodrigues – Certamente que é proposital. Como é que o Ministério Público não tem carreira para um analista formado em Direito se o MP lida somente com o Direito? Essas vagas deveriam existir e serem ocupadas por concursado. O SIMPE não é contra os comissionados. Nós não aceitamos é a precarização a que estas pessoas estão submetidas porque podem ser mandadas embora a qualquer hora e por qualquer motivo. Do jeito que as coisas estão, tem mulher que engravida e é demitida, ou por conta de adoecimentos, as pessoas são demitidas…

SINJUSC – … Mas não é o Ministério Público quem cobra de outros, das prefeituras, câmaras de vereadores, e até mesmo do  Poder Judiciário, a aplicação da lei do estágio, a quantidade de contratados sem concurso em relação aos concursados? Tem como mudar essa situação?

Gilmar Rodrigues – Sim. É o Ministério Público quem cobra de outros a lei do estágio, a equivalência entre concursados e contratados. Mas em Santa Catarina, primeiro é preciso que o MP crie o cargo de analista judiciário ou jurídico, graduado em Direito. Pelo menos um em cada promotoria. A questão é que como não tem cargo efetivo, o Ministério Público comissiona sem concurso. Não é o melhor para a sociedade. O melhor é o que defende o SIMPE, substituir comissionados por aprovados em concurso. Os próprios comissionados poderiam voltar para as vagas em que atuam, desde que aprovados em concurso.

SINJUSC – Em 2002 havia 86 comissionados no Ministério Público catarinense. Em 2017, 1.205. Também em 2002, eram 382 efetivos, e em 2017, 655. Essa é a prova de que é uma orientação no MPSC privilegiar o comissionado sem concurso?

Gilmar Rodrigues – Infelizmente, os números são esses. O MP prioriza comissionados em detrimento dos concursados e nada faz para mudar essa situação. Usam como argumento a possibilidade de demissão a qualquer hora. Mas como se vê, cada vez tem mais comissionado. Um problema é que as pessoas aceitam essas relações de trabalho. Se sujeitam ou porque precisam, ou porque vislumbram uma possibilidade futura de ingresso na carreira como membro. O propósito de privilegiar os sem concurso é político. Basta ver que o número de comissionados aumentou em quase 215 vezes em 15 anos. Ainda para demonstrar que é política a decisão, mais de 93% dos cargos comissionados estão ocupados atualmente. E pouco mais de 80% dos cargos de concurso. Então, a prioridade é continuar comissionando e não preenchendo as vagas de concurso. Por que não se abre concurso para preencher estas vagas? Porque há uma razão, uma orientação que é política, de como o Estado deve funcionar.

Leia nesta quarta-feira, 16/01, a segunda parte da entrevista. Nela, Gilmar Rodrigues revela como a cúpula do Ministério Público se organizou para defender seus interesses, e a estranha utilização de estudantes de pós-graduação em um programa de estágio pra lá de suspeito que virou referência no Brasil e foi adotado até pelo judiciário.

2 comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *