Suzana da Rosa Tolfo, professora do Departamento de Psicologia da UFSC, subcoordenadora do Estudos de Processos Psicossociais e de Saúde nas Organizações e no Trabalho (NEPPOT/UFSC) e integrante da Rede de Estudos Interdisciplinares Sobre Trabalho (Resist/UFSC), palestra no 9º Congresso do SINJUSC.
Suzana participa da mesa 2 no dia 26: Saúde: liberalismo e gestão do sofrimento psíquico e assédio. Com exclusividade, o Núcleo de Comunicação do SINJUSC entrevistou a profissional. Confira:
1) Quais os principais impactos do home office imposto pela pandemia na saúde mental dos trabalhadores?
Os impactos são paradoxais. Para alguns trabalhadores a saúde mental foi favorecida, pois o home office permitiu redução de estresses com o trânsito, com chefias autoritárias e ambientes psicossociais tóxicos por violências, discriminações e assédios morais e sexuais, maior autonomia para organizar o próprio trabalho e utilização de mais tempo para atender demandas da vida pessoal. Entretanto, as pesquisas têm demonstrado que a maioria dos trabalhadores relatam condições de trabalho limitadas pela falta de suporte organizacional para organizar e assegurar as condições materiais de trabalho (como equipamentos, mobiliários, acesso à internet e espaço físico); com sobrecarga cognitiva devido a exigências de metas, uso intensivo de tecnologia e diferentes tecnologias para comunicação; isolamento e distanciamento dos colegas; dificuldades de estabelecer limites entre tempo e demanda do trabalho e da vida pessoal e, especialmente para as mulheres, problemas para conciliar as atividades do trabalho e da família.
2) Como esses danos causados pelo home office à saúde dos trabalhadores têm sido tratadas pelos empregadores?
A pandemia chamou a atenção para a necessidade de cuidar da saúde mental, mas grande parte dos empregadores não investe para a busca de equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. A valorização do trabalho como central na vida das pessoas, o estímulo ao consumo e o trabalho como mercadoria fazem com que os trabalhadores sejam vistos como “recursos” à disposição das organizações. A questão da saúde mental, em grande parte, será negada para evitar que se identifique adoecimentos que sejam a denúncia dos problemas da organização do trabalho que ali ocorre.
3) Que alternativas e reações o surgimento do home office tem gerado no movimento sindical?
O home office ocorreu de forma majoritariamente compulsória e repentinamente, em especial no serviço público. O movimento sindical não estava, assim como os trabalhadores, preparado para identificar os problemas decorrentes do home office e a reação tem sido de avaliar o processo que se instalou a revelia e propor alternativas para o trabalho não presencial e agora o trabalho híbrido.
4) A invasão do espaço doméstico pelo trabalho causa alterações em ambas as rotinas. Qual delas perde mais? Por quê?
Geralmente é o conjunto dos trabalhos da casa que mais perde, pois a gestão da organização continua cobrando resultados e o/a trabalhador/a procura responder da melhor forma possível. Em alguns casos, foi incrementada a cobrança de resultados e metas, sem considerar as condições objetivas e subjetivas. Conforme citado anteriormente, não por acaso são as mulheres aquelas que mais relatam dificuldades e problemas relacionados à saúde mental, frente a conciliação com as novas rotinas do trabalho e das exigências de cuidados com a casa,o cônjuge e, filhos na escola.
5) A intensidade da rotina laboral sempre interferiu nas relações familiares. Essa questão se agravou com o home office? Se sim, como? Se não, por quê?
Agravou-se porque o espaço passou a ser compartihado por todos, sem que houvesse preparo para criar condições objetivas e subjetivas para a convivência intensiva e o trabalho fosse intensificado. O número de divórcios foi considerável durante a pandemia
6) O crescimento da produtividade no home office acontece à custa de mais trabalho que não está sendo remunerado, ainda sim, muitos trabalhadores e trabalhadoras preferem trabalhar de casa, porque isso acontece?
Especialmente em ambiente que apresentam riscos psicossociais e são tóxicos para a convivência, pela possibilidade de maior autonomia para a realização das atividades e a possibilidade de fazer outras coisas que não se viabilizaram com o tempo maior gasto em transporte (atividade física, cuidados com familiares).
7) Depois do trabalho, as pessoas permanecem conectadas no tempo livre. Isso também pode afetar a saúde mental dos trabalhadores? Se sim, como? Se não, por quê?
A conexão constante pode trazer sobrecarga cognitiva, pois a pessoa está constantemente atenta e sendo demandada para responder aos diversos estiímulos. A fadiga aparece invariavelmente e, não por acaso, vem se reiterando a importância do direito à desconexão, que limita o poder do empregador ou o gestor, para que garanta aos seus empregados/servidores uma jornada que respeite os dispositivos legais
8) Como encontrar um equilíbrio, tanto no trabalho, quanto na vida pessoal, em relação ao tempo de conexão? Existe uma quantidade de horas para o uso saudável da internet?
Esta ainda é uma equação pouco estudada e cuja resposta não é simples. Isso porque o trabalho já ocupava, presencialmente, parte considerável do conjunto da vida de trabalhadores e de gestores. O equilíbrio advém da possibilidade de conciliar ambos com saúde e qualidade de vida.