Assédio moral e a ‘reforma’ trabalhista

Por Laís Gouveia*

Em redações, no palco de uma grande emissora de TV, nas repartições públicas, comércio, independente do cenário, o assédio moral perpetua-se. No caso das mulheres, que já recebem menores salários que os homens (1), a cultura machista torna o ambiente ainda mais vulnerável para ocorrer esse tipo de prática. A notícia ruim é que o quadro pode piorar com a reforma trabalhista do governo Temer, que atualmente tramita no Senado Federal. 

Abaixo, relatos de mulheres que sofreram algum tipo de violência no trabalho (*). 

Rafaela: “Trabalhei sob tanta pressão nos últimos meses e fui diagnosticada com Psoríase, uma doença que pode ser adquirida pelo stress, minha mão está cheia de bolhas”. 

Ronsângela: “Meu chefe me expôs em frente aos funcionários porque cometi um suposto erro, fiquei meia hora trancada no banheiro chorando”. 

Filomena: “Me proibiram de almoçar até terminar as tarefas, passei muito mal de fome, quase desmaiei, consegui comer às 16:30h”. 

Betânia: “Meu chefe me acordou meia noite para trabalhar e fui obrigada a seguir às suas ordens, pois tenho medo de ser demitida”. 

As histórias acima envolvem mulheres que permanecem caladas engolindo sapos, às vezes, salamandras. A fila do desemprego e as represálias pela denúncia podem ser muito piores, em um país sem perspectivas, afundado numa crise político-econômica. 

Uma pesquisa da BBC Brasil realizada em 2015 apontou que metade dos brasileiros já sofreu assédio no trabalho. A consulta, que ouviu 4,9 mil profissionais do site Vagas.com, constatou que 52% dos entrevistados já foram expostos a algum abuso moral ou sexual no trabalho, mas apenas 12,5% das vítimas seguiram em frente com a denúncia, reforçando a ideia de que o silêncio se faz necessário quando, no lado mais fraco da corda, encontra-se o empregado. 

Reforma trabalhista: Indenização menor para cargos menores 

Entre algumas aberrações contidas na proposta da Reforma Trabalhista, encontra-se o pagamento de indenização por Assédio Moral, levando em conta o cargo e em graus diferentes: Assédio de natureza leve (Três vezes o valor do salário), média (Cinco vezes o valor do salário) ou grave (Vinte vezes o valor do salário). 

Veja o exemplo hipotético abaixo, caso a Reforma Trabalhista seja provada: 

Palhares é dono de uma grande empresa no ramo alimentício. Muito estressado, sempre quando chega a seu escritório, humilha a faxineira do local, chamando-a de preguiçosa. Sua secretária também aguenta todos os dias uma série de ofensas. “Burra, anta, você deveria estar lavando privada”, esbraveja o patrão. 

Cansadas de sofrerem, as duas funcionárias resolvem processar o chefe pelo mesmo caso de assédio e descobrem que, com a Reforma Trabalhista, receberão diferentes valores indenizatórios, em função de terem cargos distintos. 

No desenrolar do processo, o juiz acata a ação e define os dois casos como agressão média. A faxineira, que ganha R$ 1.000 reais mensais, receberá 5.000 mil de indenização. A secretária, que ganha R$ 3.000 reais mensais, receberá R$ 15 mil. 

A humilhação foi do mesmo grau, por que então a faxineira receberá menos que a secretária? Porque o Governo Temer quer acabar com os poucos direitos dos pobres e beneficiar patrões como o Palhares, que, com certeza, bateu panela com a camisa da CBF, berrando fora Dilma. 

No desfecho do caso do Palhares, após a longa batalha judicial, a secretaria foi diagnosticada com síndrome do Pânico, mas, infelizmente, ela não é uma exceção. Segundo informações da Previdência Social, em 2016, 75,3 mil trabalhadores foram afastados de seus empregos por apresentarem quadros depressivos. 

“Não pense em crise, trabalhe” 

O golpe de estado serviu também para atender o grande empresariado, num discurso hipócrita de combate à corrupção. É evidente que patrões deixam de lucrar quando são obrigados a seguir a legislação trabalhista, a CLT sempre foi uma pedra no seu caminho. 

Com a aprovação das reformas, triplicarão casos de assédio, trabalhadores doentes e mal remunerados. No Japão, por exemplo, são corriqueiros os suicídios por exaustão, as leis trabalhistas de lá permitem que patrões e sindicatos negociem jornadas acima das 8 horas de trabalho. A realidade brasileira pode estar bem próxima desse regime compulsório, basta a Reforma ser implementada. 

Dentro desse contexto, a única saída é a luta e pressão popular, caso contrário, décadas não serão suficientes para desfazer o desmonte do Brasil e a degeneração da classe trabalhadora. 

1- Segundo informações da Organização Internacional do Trabalho (OIT), no Brasil, as mulheres ganham 22% a menos que os homens. Para ocorrer à paridade salarial entre homens e mulheres, seriam necessários 70 anos, segundo informa o órgão. 

* Os nomes são fictícios 

* Laís Gouveia é jornalista e ex-diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE).

* Texto retirado do Blog: www.altamiroborges.blogspot.com.br

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