Autoria: Tamara Siemann Lopes – Economista do DIEESE/Subseção dos Trabalhadores do Setor Público de SC
A data-base é o período do ano em que representantes dos trabalhadores (sindicato laboral) e o patronato se reúnem com o objetivo de repactuar as condições de trabalho e as cláusulas econômicas que abrangem determinada categoria profissional. Os sindicatos de trabalhadores buscam a manutenção de benefícios vigentes e a ampliação de direitos, considerando além do contexto econômico mais geral do país e região, também a situação econômica específica do ramo de atividades em que atuam.
No caso dos servidores do Poder Judiciário de Santa Catarina (PJSC) a data-base é regulada através da Lei Complementar nº 310, de 30 de novembro de 2005, onde o artigo 18 afirma: “§ 4º Fica estabelecido o mês de maio de cada ano como data-base para negociação salarial da categoria dos servidores do Poder Judiciário. (NR)”. Com relação à situação econômica específica em que os servidores do PJSC se enquadram, a subseção do DIEESE acompanha a execução orçamentária do Poder Judiciário de Santa Catarina e tem publicado periodicamente artigos no site que apontam sucessivos aumentos da arrecadação sem aumento proporcional das despesas, o que levou à formação de um superávit orçamentário de R$ 203,14 milhões no primeiro semestre de 2021.
Em maio de 2021 o Poder Judiciário não aplicou o índice historicamente adotado pela categoria para revisão anual, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA/IBGE), que acumulou 6,76% no período da data-base maio. Este fato implicou num arrocho salarial nas remunerações dos servidores, que é definido como uma política em que os salários não acompanham os preços, o que leva a um declínio das condições econômicas das famílias cuja renda depende dos salários.
A depender da estrutura de gastos de cada família, as variações dos preços podem ser maiores do que a inflação medida pelos institutos oficiais. Tomando como referência o próprio IPCA da data-base maio cujo índice foi de 6,76%, nota-se que alguns componentes variaram muito acima do indicador geral, por exemplo, o item “alimentação e bebidas” (12,31%) e “gás de botijão” (21,11%), além do grupo de transportes (11,47%), que inclui gasolina (35,57%) e etanol (37,61%).
Aqueles que pagam alugueis também enfrentam negociações com imobiliárias e proprietários de imóveis que costumam adotar como índice o IGP-M, que no acumulado de 12 meses até julho somou 33,83%. Assim, embora a estrutura de gastos varie de família para família, o fato é que o conjunto dos servidores do Poder Judiciário não obteve a correção dos seus salários em maio de 2021, o que gerou um arrocho salarial de 6,76%.
O descontrole dos preços da alimentação, combustíveis, moradia, energia e outros itens tem origem nas desastrosas políticas macroeconômicas conduzidas pelo governo federal. Entre essas políticas merecem destaque os estímulos à exportação de produtos agropecuários em detrimento da produção de alimentos voltada ao mercado interno reduzindo a oferta de feijão, arroz, leite e seus derivados, por exemplo. Também vale destacar o desmonte e privatização do setor elétrico, especialmente da Eletrobras, na contramão do que outros países tem implementado, o que atenta contra a soberania nacional e provoca o encarecimento do preço da energia e por consequência das mercadorias, já que as empresas repassam esses custos aos consumidores. A venda de refinarias da Petrobras e a sua política de preços impactam na carestia dos combustíveis, empobrecendo ainda mais a população brasileira em benefício de acionistas.
Logo, enquanto os trabalhadores sofrem com a carestia derivada das políticas econômicas malsucedidas de Bolsonaro e seu ministro da economia Paulo Guedes, o Tribunal impõe o arrocho salarial para seus servidores. Este arrocho é percebido de forma ainda mais contundente pela categoria do judiciário à medida em que os meses transcorrem e o TJSC não sinaliza o reconhecimento do direito à data-base. Somando a inflação acumulada na data-base maio com a inflação registrada até julho calculada pelo IPCA, o aumento médio de preços já alcançou 9,25%.
Soma-se a este contexto inflacionário as implicações derivadas de uma reforma previdenciária que implementou o confisco (sob a nomenclatura de “alíquota”) de 14% aos aposentados que recebem mais de um salário mínimo. De imediato, esta reforma prejudica aqueles que são aposentados e terão seus proventos reduzidos, sendo onerados com um aumento da alíquota de, por exemplo, até 942% no caso daqueles que recebem na faixa dos R$ 7.000, passando de uma contribuição de R$ 79,30 para R$ 826 mesmo contribuindo durante toda a sua vida laboral.
Sem indicativo de mitigar estes prejuízos aos servidores e negando-se a negociar com o sindicato, o PJSC toma uma atitude temerária ao prejudicar a sua força de trabalho que mantém altos índices de produtividade mesmo num contexto de pandemia. Esta escolha insensível da administração do PJSC leva os servidores a arcarem integralmente com os prejuízos derivados da desastrosa condução econômica e política da gestão Bolsonaro, além de sofrerem perdas oriundas da reforma da previdência de Carlos Moisés.