A Resolução que te engana e desmonta o judiciário

A Resolução n. 219 do CNJ traz o bonito nome de “equalização da força de trabalho entre primeiro e segundo grau”, e dispositivos sedutores. No entanto, o TJSC utiliza-se dela para implementar sua política de superaumentar o volume de trabalho com um sistema caríssimo e que não funciona, sem qualquer discussão com os trabalhadores.

O mapa do Poder Judiciário de Santa Catarina, cujos dados foram extraídos da tabela de lotação de pessoal elaborada pelo próprio Tribunal (íntegra aqui), revelam que o TJSC desconhece a realidade nas comarcas e, pior, demonstra total descaso com aqueles que fazem do judiciário catarinense o segundo melhor do País entre os tribunais de médio porte (relatório justiça em números 2016 do CNJ).

De acordo com a tabela de lotação de pessoal publicada pelo TJ, nas unidades de primeiro grau somam-se 2.742 trabalhadores (entre cartório e gabinete). Mas, aplicando-se as fórmulas da resolução, seriam necessários somente 2.095,88. (acesse aqui para ampliar o mapa)

Isto significa que existe um excedente de 646,12 trabalhadores no primeiro grau. Onde serão lotados os servidores excedentes? Pela resolução, os trabalhadores excedentes deverão ser lotados nas unidades de mesmo grau de jurisdição com maior taxa de congestionamento ou com quantidade maior de casos pendentes antigos.

Por outro lado, no segundo grau, as coisas se invertem: o número de trabalhadores lotados nos gabinetes de desembargadores é de 214. Pela resolução, o ideal seriam 640,24. Ou seja, faltam nos gabinetes 426,24 pessoas, de acordo com a tabela publicada pelo TJ. (acesse aqui listagem com gabinetes dos Desembargadores).

Números frios, extraídos de fórmulas que pretendem enganar os trabalhadores com a cortina de fumaça “padronizar a força de trabalho no judiciário”. Um padrão único para um País continental, absolutamente fora da realidade das comarcas, cuja demanda de trabalho só aumenta e a falta de pessoal é perceptível logo ao entrarmos nos locais de trabalho.

 

O que o Tribunal de Justiça diz sobre isso?

Em janeiro, foi aprovado o “Programa de Redução das Desigualdades na Distribuições de Força de Trabalho entre o Primeiro e do Segundo Grau”. Com ele, a confusão aumenta, pois, ao contrário da tabela de lotação do TJ, descreve que há excedente de 270 servidores no segundo grau. O programa ainda traz as seguintes Propostas Preliminares (PP):

PP1 – Instituir a Diretoria de Cumprimento e Apoio Processual Remotos do Primeiro Grau (DCPG);

PP2 – Instituir Comitês Cientificas de Primeiro Grau (CCPG) e de Segundo Grau (CCSG);

PP 3 – Iniciar processo de redefinição de competência de unidades judiciárias de primeiro grau, com a instituição de varas regionais vinculadas às DTR;

PP 4 – Iniciar estudos para a instituição de varas regionais vinculadas a novas DTR.

 

Com exceção da PP2, todas elas dizem respeito às Divisões de Tramitação Remota (DTR). Na prática, DTR’s são cartórios localizados apenas nas maiores cidades, com competências que abrangem todo o Estado. Cedo ou tarde, você trabalhará numa DTR. Ela pode estar fisicamente em Chapecó, por exemplo, mas você pode vir a trabalhar com processos de Criciúma, Tubarão, Joinville, Lages, Campos Novos, etc.

Na região oeste, por exemplo, de Dionísio Cerqueira a Herval D’Oeste são 368 trabalhadores (lotados nos cartórios e gabinetes – pessoal da área administrativa não está no cálculo). Segundo a resolução são necessários apenas 302,13. Se na sua comarca houver “excedente” de servidores (e na grande maioria há, segundo a resolução) e lá não for instalada uma Divisão de Tramitação Remota, haverão remoções compulsórias?

No Estado do Ceará, por meio da Portaria n. 345/2017, o Tribunal de Justiça está implementando o desmonte local com a extinção, transformação e transferência de unidades judiciárias. Servidores foram removidos compulsoriamente.

No Estado do Paraná, estão iniciando a instalação do que eles chamam de “cartorião”, local onde são reduzidas as estruturas dos cartórios com a mesma competência. Por exemplo, juntam-se três cartórios cíveis em apenas um, diminuindo a quantidade de chefes de cartório, de servidores, com o “excedente” de trabalhadores sendo deslocado para outros setores, ou extintos.

Medidas como esta não ocorrem com descerramento, não há uma “estreia”. As DTR’s já existem pelo Estado (e pouco ou nada funcionam no modelo atual), as varas regionais vão se multiplicando, o PJSC estimula a digitalização do acervo físico – sem fornecer nem a mínima estrutura – e faz cursos na Academia Judicial para utilização de atos vinculados e otimização de procedimentos. Ou seja, a transformação do judiciário num grande call center já está em curso. Talvez o futuro do judiciário seja se tornar uma central de telemarketing, com todos os trabalhadores terceirizados.

Este desmonte com a mecanização do trabalho e a transformação dos trabalhadores em repetidores de tarefas inclui compra de sistemas de inteligência artificial que substituirão o seu trabalho, abrindo caminho para a terceirização irrestrita. Não há por parte do TJSC qualquer preocupação com a saúde física e mental dos trabalhadores. Ao contrário, aparentemente quem se preocupa com a saúde e bem estar é vadio.

Representatividade     

Desde janeiro, a Federação dos Trabalhadores do judiciário nos Estados (FENAJUD) foi suscitada a discutir o tema pela direção do SINJUSC, bem como esclarecemos ao juiz auxiliar do CNJ, Alexandre Takaschima, sobre a necessidade de debater o tema mais profundamente antes de qualquer implementação. Também participamos em Brasília, juntamente com outros 23 sindicatos dos trabalhadores do judiciário nos estados, da tentativa de audiência com a Ministra Carmen Lúcia.

O SINJUSC tem feito o debate com a categoria sobre o tema nas assembleias regionais e na assembleia geral do dia 14.06.2017. O assunto também é pauta na próxima assembleia marcada para o dia 13.07.2017, na qual sua presença é fundamental.

A Resolução do desmonte do judiciário precisa ser debatida entre os trabalhadores diretamente afetados. Não podemos deixar o TJSC enfiar goela abaixo mais uma de suas maldades.

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